sábado, dezembro 23, 2006

Murray Bookchin

Nasceu em Nova Iorque a 14 de Janeiro de 1921, filho de judeus russos emigrados. Ingressou aos 9 anos na juventude comunista, da qual foi expulso em 1937 por criticar Estaline. Após uma passagem pelo trotsquismo e pela actividade sindical como operário das fundições de aço de Nova Jersey viria, na década de 50, a sofrer a influência de militantes anarquistas emigrados que o iniciaram no pensamento libertário. Uma decepcionante experiência sindical no âmbito da CIO a par duma atitude crítica relativamente ao marxismo e a algumas versões do anarquismo conduziram-no a uma visão social da ecologia vinculada a uma opção política descentralizadora – o municipalismo libertário.

Deu assim uma expressão coerente e vigorosa a elementos presentes em grau variável em diferentes correntes do pensamento anarquista, pelo que se pode dizer que foi o fundador da moderna corrente anarco-ecologista. A falta de perspectiva ecológica do anarco-sindicalismo tradicional (reforçada talvez pela sua negativa experiência sindicalista) esteve na origem da sua animosidade para com esta corrente do pensamento libertário.

Por outro lado o seu municipalismo libertário é mais inovador na designação que no conteúdo, uma vez que a comuna, o município e o federalismo estão há muito presentes no pensamento libertário e até no republicano federal e monárquico liberal (v.g. Herculano). Talvez por procurar raízes em diferentes modelos históricos e assumir atitude relativamente pragmática o seu municipalismo libertário tenha sido acusado de menos coerente e até de “reformista”. É possível que a ideia municipalista, muito vinculada a uma estrutura político-administrativa de origem romana vigente no mundo dito ocidental, não seja tão facilmente aplicável noutras sociedades como as africanas, asiáticas e mesmo em áreas de população predominantemente indígena do continente americano.

Seja como fôr, Bookchin é indubitavelmente um dos grandes pensadores libertários do século XX e deixará uma pegada indelével na formulação teórica dum movimento de sua natureza multímodo, inquieto e irreverente (quiçá menos irreverente do que se julga). Livros como «The Ecology of Freedom”, “Urbanization without Cities» ou «Remaking Society” foram extremamente importantes para a minha formação como, certamente, para milhares doutras pessoas.

É importante assinalar que Bookchin foi essencialmente um autodidacta, obrigado a ganhar a vida como operário e não tendo podido aceder, pela modesta condição económica da sua família, a graus académicos. O que não o impediu de adquirir extensos conhecimentos, desenvolver as suas próprias teorias e fundar, em 1974, o Institute for Social Ecology (Vermont). Como não impediu a sua contratação para professor do Ramapo College de Nova Jersey. Publicou centenas de artigos e uma vintena de livros e foi um conferencista prolixo.

Faleceu aos 85 anos, por doença cardíaca, em 30 de Julho de 2006.

<<texto retirado da edição nº 219 de “A Batalha”>>

Porque Ecologia Social? http://www.achiame.net/textos/bookchin_ecologiasocial01.htm

Institute for Social Ecology http://www.social-ecology.org/

sexta-feira, dezembro 01, 2006

Rossport

Há mais de um ano, militantes da WSM (Movimento de Solidariedade dos Trabalhadores) e do movimento libertário, se envolveram profundamente na luta de uma pequena comunidade rural na Irlanda, contra a construção de uma refinaria de hidrocarbonetos pelo consórcio da Shell, Marathon e Statoil, que é apoiado a rajadas pelo Estado irlandês.

A origem desta luta é o campo de gás de Corrib, no litoral do município de Maio, ao oeste da Irlanda. O gás foi descoberto e pertence a Enterprise Oil, do consórcio já mencionado. O governo ofereceu ás empresas prospectoras direitos de negócios exclusivos na exploração do campo de gás. Mas isso não é tudo, além do mais, eles poderão deduzir seus custos do pagamento de impostos, com isso quem financiará todo este processo na realidade serão os irlandeses com seus impostos, que, em troca, não receberão nada, nem sequer uma redução no preço do gás.

Para processar o petróleo, o consórcio recebeu uma permissão para construir um oleoduto desde o campo de gás até um local chamado Bellanaboy, sem o consentimento da comunidade local, que, razoavelmente, estão preocupados com as consequências de viver ao lado de uma refinaria, com os riscos que traria a sua saúde e segurança. O conteúdo transportado neste oleoduto não seria processado e se encontraria sob forte pressão. Mais ainda, para chegar na refinaria, atravessaria as terras da população local, que temem que qualquer estrago no oleoduto poderia destruir seus lares, com consequências fatais. Este não é um fato improvável, já que o oleoduto cruza terrenos húmidos e instáveis, numa área com tendência à enxurradas.

O mesmo terminal, com certeza, causará estrago em longo prazo, não só aos vizinhos, mas a toda a região. O processamento dos hidrocarbonetos, por definição, é extremamente prejudicial para o ecossistema, algumas estimativas sugerem que haverá emissões no ar de ao menos 30 milhões de pés cúbicos. O terminal se encontra só a dois quilómetros das fontes de água da região, e estas emissões se espalham com o vento. Além do mais, há que considerar as águas contaminadas que serão jogadas diariamente na baía de Broadhaven, fonte de vida para os pescadores e lugar de reprodução da vida silvestre. A drenagem para as águas contaminadas não foi construída para suportar chuvas intensas, pese que nesta parte da Irlanda chove quase sempre.

Isto significa que o prumo, níquel, magnésio, fósforo, cromo, arsénico, mercúrio, assim como o radónio (um gás radioactivo) acabariam nas fontes de água da área circundante.

Apesar das repetidas intenções da comunidade local para prevenir isto através do sistema legal, eles foram ignorados por um governo e um sistema judicial que age como mercenários da Enterprise Oil. No ano passado a Shell demandava aos fazendeiros locais que esses não podiam, legalmente, evitar o ingresso as suas terras para a construção do oleoduto que afectarão a eles e às suas famílias. Quando estes fazendeiros se recusaram a aguentar esta situação, então eles foram encarcerados. Este acto despertou a indignação pública e, finalmente, depois de 92 dias em prisão, estes homens foram libertados, poucos dias antes de um protesto nacional.

Por mais de um ano foi mantido um piquete no lugar da refinaria para postergar sua construção. Em Outubro deste ano, Enterprise Oil realizou um esforço organizado para dissolver a campanha local mediante o uso da força. Centenas de polícias foram levados para esta parte remota da Irlanda para prevenir a comunidade local para o bloqueio dos camiões e trabalhadores em trânsito ao lugar.

Esta operação, até agora, não parece bem sucedida já que, apesar de dissolverem o piquete, eles não quebraram o espírito de resistência. Aliás, a solidariedade mostrada por todo o povo da Irlanda, assim como o êxito do uso da acção directa em relação às medidas legais, endureceu a licença nesta campanha. Tomará vários anos de construção antes que a refinaria entre em operação, e ainda quando estará completa, o complexo terá que ser garantido eventualmente contra uma comunidade adversa. Colocado neste contexto, a tarefa da Enterprise Oil e o Estado são extremamente difíceis, e há esperanças para a vitória.

A WSM esteve activa na comunidade e na campanha nacional desde o seu início. Para nós, sua base está na acção directa; uma comunidade que luta pelo controle de seu ambiente e das decisões que os afecta. Como anarquistas, acreditamos que a única maneira de que a classe trabalhadora desenvolva a compreensão do capitalismo e o potencial de derrotá-lo, é por meio da luta. Por isso, sempre apoiamos e estimulamos à luta, e a vitória de Rossport será a vitória de todo o povo.

Ronan McHugh

(Extraído do nº1 de "Liberación", boletim em castelhano da WSM)

"Liberación" no formato PDF:
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